segunda-feira, 11 de março de 2019

Memória, história e realidade!





Por: Rosangela Nascimento

Aqui está sendo utilizado um veículo chamado imaginação cujo combustível denomina-se mergulho no tempo, para tentar responder a uma inquietante pergunta. O que é ser mulher negra? Então vamos adiante.
Idos do século XVI de olhos fechados sinto o cheiro da fumaça, ouço gritos. De crianças, homens, mulheres. O calor, provocado pelo fogo proposital para aumentar o horror, a correria desesperada. Então, um disparo, outro disparo, outro e outros. E, alguns corpos vão surgindo no chão, marcando-o com sangue.
Quando dei por mim, estava em alto mar, via uma imensidão azul, diante de um sol forte que não me permitia abrir muitos olhos. Os gritos, choros de muitas pessoas eu ainda ouvia. Não entendia o que eles diziam, pois primeiro batiam, depois gritavam e ameaçavam. Naquela embarcação suja, fedida, algumas mulheres agarradas com suas crianças nos braços, o medo, a tristeza e as incertezas eram suas companheiras.
Um grupo de mulheres com seus erês (crianças) nos braços jogavam-se ao mar. Enquanto, tento reconstruir o cenário deste recorte de torturas via a dor daquelas mulheres, que ali estavam não a passeio, mas com uma única finalidade lucro para “alguns”. Chegando a uma terra estranha, seus amados filhos eram arrancados de seus braços e vendidos como um pequeno pedaço de carne preta, sem valor e barata. Os homens vendidos para trabalhos pesados, e as mulheres para os afazeres domésticos incluindo os sexuais. Durante a noite algumas tinham pouco intervalo de descanso, pois amamentavam os filhos e filhas de seus senhores, alimentando a cicatriz da desumanização. Outras choravam inconsoladamente a perda de suas crianças que não veriam mais, esta dor doía mais que chibatadas e torturas realizadas pelos feitores. 
Anos, e anos vão passando e chegamos ao século XXI e pouco mudou na realidade de vida das mulheres negras, que compõem metade da população feminina. Ainda, enfrentamos os reflexos do período escravocrata. Os indicadores de gênero com o recorte de raça/classe de acordo com o IBGE apontam uma triste realidade das dificuldades traçadas e enfrentadas por todas nós.  
Dito tudo isto, é importante colocar que no Brasil começou no final da década de 1970 o Feminismo Negro, movimento social das mulheres negras. Tendo como umas das suas principais, liderança a Lélia González e Sueli Carneiro, colocando em pauta o discurso de gênero e suas produções teóricas sobre raça e classe. Dando visibilidade às disparidades existentes entre mulheres negras e brancas.
E eu, sou uma das que estão entre as minorias, invisibilizada, criando alternativas para sobreviver. Ser mulher e negra. É isso, se colocar no lugar da protagonista, a anti- heroína da trama, excluída e recuperar forças para continuar. Trazer à tona o que possibilita um mundo melhor, sem violência, ou, sem violação de direitos humanos. É confortar a mãe que perde seu filho/a, é criar uma rede de proteção e fortalecimento para as mulheres.
Mesmo no cenário de estruturas racistas, machistas, misógina as mulheres tentam sobressair, no dia 8 de março está sendo organizada uma paralisação internacional que conta com a adesão de mais de 30 países, com a frase que ecoa nas redes chamando de greve interplanetária “Se nossas vidas não importam, que produzam sem nós”.
A Patrícia Zaidan no texto para a revista Claudia, traz um recorte desta mobilização. Que diz: Angela Davis e a filósofa Nancy Fraser, publicaram em The Guardian uma carta anunciando que está nascendo um novo movimento feminista, de caráter internacional, com os tentáculos expandidos para se contrapor ao racismo, ao sexismo, à misoginia e à economia que tem escravizado as mulheres. Não é mera coincidência: somos as mais pobres em todos os países da Terra. Com salário sempre menor que o dos homens e obrigadas a nos submeter a uma obtusa lógica de produção, que suga a energia, devolve pouco e ainda rouba o tempo que poderíamos ter para nós mesmas.

Como diz a Jurema Werneck diretora - executiva da Anistia Internacional Brasil nossos passos vêm de longe. E nesta caminhada foram construídas redes, pontes e rios de solidariedade, onde a luta é por todas, mesmo as que não conhecem seus direitos. Essa força e união movem de fato um planeta. Um mundo mais justo e sem violação de direitos. Nem uma a menos, queremos viver com dignidade!  

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